Planos de saúde: reajustes e intervenções

Sandra Franco*

O setor de saúde suplementar vivencia um problema crônico. A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), no cumprimento de seu dever, tem exigido das operadoras adequações constantes para que se ofereça um melhor serviço na saúde privada, cobrando-se valores mais justos.

No entanto, no que se refere ao controle de índices de reajustes dos planos coletivos, a agência alega haver uma condição de igualdade entre as empresas (contratante e contratada), de forma que o usuário não estaria sendo prejudicado, dado ao poder de negociação dos envolvidos. A saber, os planos coletivos são os que utilizam uma pessoa jurídica para fazer a intermediação entre o titular do plano e a operadora. Eles existem nas modalidades empresarial, geralmente contratado pela empresa empregadora, e por adesão, contratado por associações e sindicatos.

Não obstante, a variação entre os percentuais de reajuste das mensalidades e a inflação tem preocupado aos consumidores. É fato que os custos na área de saúde têm aumentado além dos índices oficiais. A tecnologia disponível sem dúvida colabora para o aumento de custos. Não se questiona a importância da incorporação de exames com equipamentos mais modernos e precisos, mas não se pode negar que o impacto sobre o custo é alto. Poderia também ser indicado como fator de alta a ampliação de procedimentos com cobertura obrigatória. Como explicar que um plano tenha aumento de 6% e outro seja reajustado em 45%?

Diante desse cenário, tramita no Senado Federal um projeto de lei pelo qual os reajustes dos planos de saúde coletivos terão de ser submetidos à Agência Nacional de Saúde (ANS). A proposta do PLS 282/2014 e’ de acrescentar um artigo à Lei 9.656/1998 para que os índices dos planos coletivos sejam regulados e limitados pela ANS. Atualmente, só os planos individuais sofrem a intervenção direta da agência.

Os planos coletivos estão dominam o mercado nacional, cerca de 79% dos 50 milhões de beneficiários brasileiros de planos de saúde, conforme dados da ANS. Se comparado aos individuais, os planos coletivos apresentam uma legislação mais branda, a qual é atraente para as operadoras. O resultado tem sido o desaparecimento da oferta de planos individuais, pois mesmo o consumidor não beneficiado por um plano empresarial está sendo levado a contratar planos coletivos através da filiação à associações falsas, criadas especialmente para este fim.

Esses grupos de menos de 30 usuários, porém, têm como característica o desnível de forças quando da negociação não somente de reajustes, mas também das alterações da rede credenciada, acesso aos serviços e o que mais for necessário.

A exigência da ANS no momento para com esses grupos é a de que todos os contratos das operadoras com menos de 30 beneficiários deverão apresentar o mesmo índice, independe da sinistralidade que cada um representa; o que pode ser positivo ou negativo para o grupo, já que alguns grupos acabarão por pagar mais do que pagariam, sem que fosse por uma média entre todos, o chamado “pool de risco”.

Para se ter uma ideia, o índice aprovado pela ANS para o aumento dos planos individuais foi de 9,65%. Tal índice incide sobre os contratos de 8,8 milhões de consumidores, o que representa 17,4% do total de 50 milhões de beneficiários de planos de assistência médica no Brasil, segundo a própria agência. De outro lado, os planos coletivos apresentaram reajuste de até 45% de aumento.

A ideia é a de beneficiar o consumidor. Não obstante, as operadoras entendem que o benefício é relativo a longo prazo, pois as empresas, diante de um cenário de perda financeira pelo desequilíbrio de preços e de despesas, acabarão por diminuir a oferta desse produto, tal como ocorreu com os planos individuais.

Embora aparentemente mais fácil, talvez a interferência constante dos agentes reguladores na saúde privada não seja ainda o melhor remédio para conter abusos. Uma conversa comprometida de gente grande, envolvendo economistas da área da saúde, técnicos atuarias, representantes das operadoras, membros do Mistério da Saúde e da ANS para que se chegue mais próximo de um real benefício para a sociedade seria o melhor caminho.

Evidente que o desequilíbrio na balança financeira das operadoras poderá trazer um efeito adverso: os planos de saúde, enquanto um benefício para muitos trabalhadores, estarão com a existência comprometida, pois as empresas deixarão de arcar com um elevado custo. E, certamente se os milhões de usuários desses planos migrarem para o SUS, aumentarão os problemas da já saturada saúde pública.

Existem certos males que realmente vêm para o bem. Não estaríamos diante de um desses casos? Não seria necessário repensar a intervenção constante do Estado?

* Sandra Franco é consultora jurídica especializada em direito médico e da saúde, é presidente da Comissão de Direito da Saúde e Responsabilidade Médico-Hospitalar da OAB de São José dos Campos (SP), conselheira no Conselho Municipal de Saúde (COMUS) de São José dos Campos (SP), presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde, MBA Executivo em Saúde e doutoranda em Saúde Pública – [email protected]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *