Clínica popular: alternativa sustentável para filas de espera

Sandra Franco*

As chamadas clínicas populares apresentam-se como uma nova opção de negócio que favorece pacientes, médicos e profissionais da saúde. Trata-se de uma alternativa para os brasileiros que não conseguem ter acesso rápido ao SUS, em especial aqueles que, desempregados ou atingidos pela crise, já não conseguem pagar um plano de saúde.

O caos da gestão da saúde no Brasil, caracterizado pela má administração e falta de recursos públicos, impulsionou a saúde privada para além dos planos de saúde e consultas particulares tradicionais. Alguns médicos perceberam que poderiam oferecer seus serviços diretamente aos pacientes, sem o intermédio dos planos de saúde, por valores iguais ou maiores daqueles que recebiam enquanto credenciados. Assim, surgiu a ideia de oferecer atendimento a casos não complexos, mas que representam a maioria dos atendimentos em um pronto atendimento.

Esse tipo de clínica se tornou um fenômeno recente, que merece atenção e reflexão. As clínicas populares oferecem, em geral, facilidade para a marcação de consultas por um preço que cabe no bolso do brasileiro. Cabe ao paciente verificar se estes estabelecimentos são regulares.

O paciente deve pesquisar sobre a procedência da clínica e dos profissionais médicos que nela atendem, para não cair na cilada de ser atendido por quem não é médico ou por médicos não especializados. O ideal é consultar o CRM da clínica e da lista de médicos para se certificar da garantia do serviço.

É importante se certificar também se o preço cobrado por essa clínica, inclui exames ou qualquer outro serviço adicional, muitas vezes necessário ao diagnóstico. Uma consulta pode ser muito barata em detrimento de um exame oferecido pela clínica que apresenta valor acima do mercado – é preciso estar atento!

Para os médicos, não é demais dizer que as clínicas populares têm transformado o setor. O sucesso do modelo de negócio tem empresas médicas a concretizarem seu projeto de sair das tradicionais parcerias com as operadoras de planos de saúde. Voltadas inicialmente para as classes C e D, hoje já atendem a necessidade de pacientes de todas as classes sociais, sufocados pela crise econômica e política que gera efeitos sociais nocivos em nossa sociedade. Efeitos diretos na saúde.

Sem dúvidas, a maior parte dos atendimentos advém da falta de estrutura e do descaso da saúde pública, refletida no SUS.

Estudo recente aponta que nas clínicas populares um grande atrativo mercadológico é a característica dos pagamentos: 80% das receitas financeiras advêm de pagamentos diretos dos clientes e apenas 20% advêm de planos de saúde e convênios médicos, quando há abertura para procedimentos realizados por planos.

Para alguns médicos, entretanto, as clínicas populares representam uma concorrência desleal em razão de as consultas serem de baixo valor. Ocorre que, para a Associação Médica Brasileira, o valor mínimo não aviltante de remuneração de serviços profissionais é o contido em sua tabela de honorários médicos, que poderia ser a da própria AMB, a qual hoje não é obrigatória.

A tendência das clínicas populares é a de fixar valores a partir das circunstâncias do atendimento e a prática local. Evidente, porém, que o adjetivo “popular” possui o escopo de atrair determinado público, o que por si não caracterizaria a intenção de o médico prejudicar os colegas.

O SUS está sobrecarregado, a população apresenta um poder econômico diminuído pela crise, mas os problemas de saúde não deixam de existir. Não haverá maior financiamento para Saúde, pelo contrário. O governo busca ainda a autorização da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para oferecer à população o chamado “Plano de Saúde Popular”. Se aprovado, seria um chance de as operadoras disputarem esse público com menor poder aquisitivo.

Por ora, a lacuna existente entre SUS, planos de saúde e consultas particulares continuará a ser ocupada pelas clínicas populares, que são a alternativa sustentável para profissionais e pacientes.

*Sandra Franco é consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde, presidente da Comissão de Direito da Saúde e Responsabilidade Médico-Hospitalar da OAB de São José dos Campos (SP), membro do Comitê de Ética da UNESP para pesquisa em seres humanos e Doutoranda em Saúde Pública.

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